A violência que você não vê

“Se eu pedir ajuda, o que eu vou dizer? Que ele nunca me bateu?”

Essa é uma das frases da personagem de ALEX (Margaret Qualley) na série MAID, mas poderia ser dita por diversas mulheres nos atendimentos que realizamos, em especial aquelas que enfrentam processos dolorosos de divórcio. A frase também pode ser um retrato da paralisia que toma conta da mulher diante da violência psicológica.

A violência psicológica demora para ser reconhecida pela mulher e, antes da Lei 14188/2021, era difícil encontrar um correspondente criminal que permitisse que o companheiro/marido respondesse penalmente pela conduta, embora desde a concepção da Lei Maria da Penha essa era tratada como uma das violências das quais a mulher pode ser vítima.

Atualmente é possível ver no Art. 146-B do Código Penal a descrição de diversas condutas que, se executadas pelo homem, podem fazê-lo responder por esse crime que tem pena que varia entre 6 meses e 2 anos.

Traduzindo o que é delimitado no tipo penal para o cotidiano de muitos relacionamentos abusivos, é possível observar a existência desse tipo de violência quando, por exemplo, o homem ameaça fazer um escândalo na frente dos amigos, caso ela insista em sair. Quando ele corta os recursos financeiros dela, se ela não se afastar dos familiares ou trata a mulher, na frente de outros, com muito desrespeito, com intuito de humilhá-la ou ridicularizá-la. Quando ele não permite que ela receba em casa qualquer visita de amigos ou familiares. Ameaça colocar para fora de casa filho maior de idade, como forma de manipular a mulher. Quando ele proíbe a mulher de usar o telefone, ter redes sociais ou qualquer outro tipo de contato social. Todas essas condutas, se acarretarem prejuízo à saúde psicológica da mulher, serão passíveis de punição.

Além da tipificação da violência psicológica, outro ganho importante foi o enunciado do último FONAVID – Fórum Nacional de Juízas e Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (Enunciado 58) asseverando que o dano emocional prescinde de exame pericial, facilitando assim os meios de prova do referido crime.lo a restituição de um veículo indevidamente levado pelo homem, a suspensão de todas as procurações dadas, mas é preciso entender que as providências, em sede de Medida Protetiva, são limitadas e devem ser precisas quanto à providência a ser requerida. Situações mais complexas que demandam, por exemplo, provar que o bem um dia existiu, necessitam de ações judiciais tradicionais e podem demorar muito.

Fato é que a violência psicológica dificilmente vem com uma etiqueta de identificação e, por vezes, é preciso um longo tempo para que a mulher perceba seu adoecimento emocional diante de tantas condutas do marido/companheiro. A demora em se perceber vítima dessas condutas pode ser devastadora a longo prazo e recuperar a saúde mental pode ser igualmente um longo caminho. O melhor é pedir ajuda, buscar aconselhamento profissional e cessar os efeitos dessas condutas o quanto antes.

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